Íntegra do discurso da Ministra da Cultura na 21ª Sessão do Conselho Nacional de Família

DISCURSO PROFERIDO PELA MINISTRA DA CULTURA, Dra. CAROLINA CERQUEIRA, NA 21ª SESSÃO DO CONSELHO NACIONAL DA FAMÍLIA – Luanda, 15 de Maio de 2018.

 

MC

 

 Excelência, Sra. Ministra da Acção Social, Família e Promoção da Mulher, Dra. Victória da Conceição,

Excelência Sra Vice Governadora Para a Área Politica e Social da Província de Luanda – Dra Ana Paula Victor

Excelentíssimo Representante do Sistema das Nações Unidas em Angola, Sr Paolo Baladeli

Excelentíssimo Sr Administrador de Cacuaco Dr. Carlos Cavuquila

Senhor Deputado Mendes Bartolomeu

Excelentíssimo Senhor Secretário de Estado para a Acção Social – General Lucio do Amaral

Excelentíssimos Vice Governadores e Vice Governadoras Provinciais

Caras Autoridades Civis, Tradicionais e Religiosas

Caros membros do Conselho Nacional da Família,

Distintos convidados,

 É, para mim, uma grande honra presidir a esta 21ª Sessão do Conselho Nacional da Família, que se realiza sob o lema “A família como modelo de valores e de inspiração dos filhos”.

Não é por acaso que hoje, Dia Internacional da Família, nos encontramos aqui reunidos para discutir aspectos relevantes relacionados com o papel que a família deve desempenhar numa sociedade como a angolana.

Este encontro reveste-se de enorme importância, porque se realiza num momento particular do ponto de vista social para o nosso país, porque se adensa nos últimos tempos a discussão acerca do rumo que o país deve tomar e do papel da sociedade para definição desse rumo e do contributo que os vários segmentos da sociedade devem dar com esse mesmo objectivo.

A opção democrática, feita pelos diferentes actores angolanos (políticos, sociais e económicos), obriga-nos a todos a auscultar a população e as organizações da sociedade civil, para concepção e para execução de políticas públicas. Se esta é a regra geral, penso que as áreas da acção social, da família, da infância e da promoção da mulher não podem constituir excepção a esta regra.

E se recordarmos essa orientação de Sua Excelência o Presidente da República, João Manuel Gonçalves Lourenço, proferida aquando do discurso acerca do Estado da Nação em 2018, teremos todos de reflectir acerca do espaço que temos dado à sociedade civil, à academia angolana e aos próprios cidadãos, para contribuírem na concepção de políticas públicas. Os destinatários das políticas públicas têm de ser chamados a colaborar nesta missão e contribuir para o fortalecimento das nossas famílias e o resgate do seu valor no bem estar da Nação.

 Caros membros do Conselho Nacional da Família,

Ilustres convidados,

A missão deste Conselho inclui a promoção e a valorização da família, enquanto instituição de base da sociedade, bem como a valorização da pessoa humana. Isso pressupõe o conhecimento e o respeito pelos direitos fundamentais da pessoa humana, a promoção da inclusão social e o fomento de importantes factores como a educação e o emprego, de modo que se vá garantindo a melhoria na qualidade de vida dos cidadãos.

Não constitui mero acaso, a escolha do lema para esta sessão de trabalho do Conselho Nacional da Família. A direcção do Ministério decidiu destacar os valores morais, como suporte da manutenção da harmonia social e da própria família, enquanto célula base da sociedade.

Temos consciência que o conhecimento e a promoção dos valores morais devem partir do seio da família. É desde o início do processo de socialização que a família deve inculcar nos mais novos o conhecimento e o respeito pelas normas morais, o patriotismo e o respeito pelos símbolos nacionais e pelos símbolos locais e pelas figuras históricas.

Os tempos conturbados de crise económica e social que vivemos trazem à luz do dia uma série de atropelos às regras morais, de modo que podemos considerar que vivemos um período de agudização dos problemas sociais. Os efeitos para a sociedade são dos mais nocivos, pois comprometem o objectivo comum de dignificação da pessoa humana e de melhoria progressiva das condições de vida dos angolanos.

Que valores estão hoje em crise? Vou procurar inserir-me neste debate, tentando responder a esta pergunta.

A meu ver, o primeiro dos valores em crise está relacionado com a preocupação e o respeito pelos demais, que hoje é atropelado por pessoas das várias faixas etárias, num grande esforço de promoção do individualismo e do egocentrismo, sempre com o objectivo de cada um lucrar mais que o outro.

A solidariedade social é outro valor que a actual crise económica e social tem vindo a afectar negativamente. As pessoas estão a ser cada vez menos solidárias, esquecendo-se que o auxílio aos mais necessitados contribui para o aumento da harmonia em sociedade.

Não posso deixar de referir a corrupção, como um mal generalizado que precisamos todos de combater, cada um no seu posto.

Devem concordar comigo se eu afirmar que as famílias angolanas têm de saber ultrapassar estes atropelos às regras sociais.

Mas penso que devo referir aqui, também, um problema social de grande dimensão, que está relacionado com a quebra de valores morais e que prejudica seriamente a coesão social. Trata-se da proliferação de denominações religiosas, que surgem supostamente para contribuir para a harmonia social, mas de facto muitas delas são usadas como fachada para garantir o enriquecimento menos lícito e nada moral de alguns falsos profetas, que mais não são do que promotores de iniciativa privada com o rótulo de religião. Nestes casos, a religião é usada instrumentalmente, com o objectivo de ludibriar as pessoas que se encontram necessitadas de apoio e tranquilidade espiritual e vão alimentando esses falsos profetas.

Tanto o Estado, quanto a sociedade, devemos juntos saber prevenir este mal, que ameaça a coesão social e pode até ameaçar a soberania nacional e os interesses do Estado.

Faço, pois, um apelo às comunidades e às famílias angolanas para que denunciem os falsos profetas, que mais não são do que promotores da desordem e da desarmonia social. São normalmente auto-proclamados pastores, sem qualquer formação teológica, que se juntam em associações de carácter ilegal e amoral, para ludibriar o próximo. Esta atitude nada tem a ver com crença religiosa nem com o auxílio ao próximo. Pelo contrário, visa apenas extorquir e enganar com falsas promessas de cura, enriquecimento fácil, sucesso profissional, financeiro e amoroso e muitas vezes recorrem a práticas feiticistas que ferem a moral e a ordem pública.

Reafirmo a necessidade que o Estado angolano tem de obter a participação da sociedade e das famílias angolanas, para iniciarmos juntos o combate a este mal que afecta as nossas cidades.

 Permitam-me também ressaltar ainda a importância do exemplo no seio da família, exemplo de vida, exemplo de conduta, exemplo de lisura e de honestidade, elevando o valor do trabalho como caminho para a dignidade e promoção de valores. 

 O trabalho torna possível simultaneamente o desenvolvimento da sociedade, o sustento da família e também a sua estabilidade e prosperidade, afectando a falta de emprego, de várias maneiras a serenidade e a estabilidade das famílias.

 Não podemos esquecer a degeneração que a violência causa na sociedade, quando de forma egoísta e brutal as relações humanas e pessoais enveredam num ciclo vicioso de violência crescente, gerando em espiral contínuas ameaças à estabilidade familiar e social, desestruturando o tecido social e afectando o equilíbrio e a coesão da Nação.

O bem da família é decisivo para o futuro do mundo e a riqueza das Nações.

Estes riscos que acabei enunciar podem e devem ser mitigados para se salvaguardar papel da família, para que esta não se transforme num lugar de passagem, aonde uma pessoa vai quando lhe parece conveniente para si mesma ou para reclamar direitos, enquanto os vínculos, as relações são deixados à precaridade volúvel dos desejos e das circunstâncias.

A família deve continuar a ser o nosso porto seguro.

Felizmente em muitos países em várias partes de África e no nosso caso também os valores tradicionais em cada familianão conseguiu enfraquecer alguns valores tradicionais e em cada família o geram na maior parte das vezes uma forte união entre as famílias alargadas, onde se conserva ainda um sistema bem definido de gestão de conflitos e de dificuldades.

 

Distintos convidados

Muitas são as preocupações que afectam a sociedade e as famílias e gostaria de chamar a atenção para a exploração sexual da infância, que constitui uma das realidades mais duras e perversas da sociedade actual.

 Além disso, nas sociedades feridas pela violência da guerra, dos conflitos, acabam deterioradas as situações familiares, sobretudo nas grandes cidades e nas sua periferias cresce o chamado fenómeno dos meninos de rua.

O abuso sexual das crianças é muito mais escandaloso, quando se verifica em ambientes onde deveriam ser protegidas, particularmente nas famílias e nas comunidades e algumas instituições de assistência e apoio social.

Neste dia reflitamos igualmente no apoio e necessidade de integração dos vulneráveis, quer sejam os migrantes e os refugiados que procuram abrigo ou melhores condições de sobrevivência no nosso país, quer sejam os deficientes, quer sejam os idosos, os doentes, as famílias que vivem em situações de pobreza aflitiva, famílias destruídas, filhos desenraizados, idosos abandonados, crianças órfãs de pais vivos, jovens e adolescentes desorientados e sem regras, estás são algumas das situações que merecem a nossa reflexão profunda e acções contínuas e corajosas para resgatar o verdadeiro papel da família. 

 

 

Nos nossos dias, a mudança antropológica cultural influencia todos os aspectos da vida e requer uma abordagem profunda e diversificada do papel da família, com mais espaços de liberdade, com uma distribuição equitativa de encargos, responsabilidades e tarefas, valorizando mais a comunicação pessoal entre os seus membros, contribuindo para humanizar toda a vida familiar, esbatendo o perigo do individualismo exagerado que desvirtua os laços familiares e acaba por considerar cada elemento da família como uma ilha, fazendo prevalecer em muitos casos a ideia do sujeito que se constrói segundo os seus próprios desejos.

 As tensões causadas por uma cultura individualista exagerada da posse e fruição geram no seio das famílias dinâmicas de impassividade e agressividade a que poderíamos acrescentar o ritmo de vida actual, o stress, a organização social e laboral que são factores culturais que colocam em risco a possibilidade da partilha e da motivação para a generosidade e de um novo modelo de vida norteada por objectivos nobres e disciplina pessoal.

 Excelência, Sra. Ministra,

Distintos membros do Conselho Nacional da Família,

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Saúdo efusivamente a iniciativa do Ministério da Acção Social, Família e Promoção da Mulher, de pretender lançar proximamente o projecto “Minha família, minha inspiração”, que visa resgatar o papel de charneira que as famílias devem assumir na socialização das crianças, adolescentes e jovens.

De facto, as famílias e as comunidades angolanas precisam de reganhar o lugar central na difusão de valores positivos. Penso que não podemos deixar esta responsabilidade quase que apenas com a escola, pois enquanto isso ocorrer, serão os grupos informais a substituir a família nesta sua tarefa. E as consequências disso são bastante negativas para a sociedade e para o futuro de Angola e dos angolanos.

O resgate dos valores culturais angolanos, dos valores morais, do civismo e dos valores patrióticos precisa de estar na ordem do dia das famílias e das comunidades angolanas. Por isso é que se recomenda que a família e a comunidade andem sempre de mãos dadas. O processo de urbanização tem afastado a família da comunidade, mas precisamos de reverter rapidamente esse quadro, com uma maior participação das autoridades locais e autoridades tradicionais.

Por isso, ousamos recomendar que o Conselho Nacional da Família se debruce acerca da relação que a família deve continuar a manter com a comunidade (por um lado) e com os valores culturais e os elementos positivos da tradição (por outro lado).

 

Caros membros do Conselho Nacional da Família,

Gostaria de mencionar, agora, um fenómeno que coloca a família em perigo e afecta também a boa harmonia social: a fuga à paternidade, de que resultam distúrbios na formação da personalidade das crianças.

Cada um de nós deve assumir as suas responsabilidades, enquanto seres humanos que somos. A fuga à paternidade ocorre mais do lado dos pais, mas há mães que cometem o mesmo erro. Ainda ontem tomamos conhecimento de dois casos hediondos de abandono de recém nascidos um deles trigémeos, cujas cenas magoaram os nossos corações.

A ausência do pai, a fuga paternidade penaliza gravemente a vida familiar, a educação dos filhos e a sua integração na sociedade, podendo tal ausência ser física, efectiva, cognitiva e espiritual privando os filhos do modelo adequado do comportamento paterno.

Os pais angolanos precisam de assumir responsabilidades repartidas na educação e na garantia do bem-estar dos filhos. Estou convencida que a sociedade não pode continuar a encarar este problema como se ele não ocorresse, porque os seus efeitos negativos vão sentir-se mais tarde.

Por isso, considero oportuno sugerir-vos que seja aprovada legislação apropriada, que considere os elementos da tradição e os valores culturais autóctones, que obrigam cada um a assumir a sua responsabilidade, de modo que as crianças não sofram devido à ausência de um ou dos dois progenitores. Uma coisa é quando isso ocorre de forma irremediável, fruto do acaso; outra coisa é quando a fuga se faz por decisão do pai ou da mãe da criança, em prejuízo desta.

Em sociedade, cada um tem de assumir a responsabilidade pelas suas decisões. Não podemos permitir que as crianças continuem a ser prejudicadas devido a actos irreflectidos dos seus progenitores.

 

Excelência, Sra. Ministra,

Minhas Senhoras e meus Senhores,

Não posso deixar de saudar a iniciativa de inauguração do “Jango de valores”, que ocorreu há pouco.

Este local vai certamente assumir o papel que o jango possui nas comunidades, que é o de ponto de encontro para debate dos problemas da comunidade. E sendo um “Jango de valores”, a preservação dos valores vai com certeza estar no centro das discussões e das reflexões que o local venha a albergar.

 

Caros membros do Conselho Nacional da Família,

Vou aqui lembrar que Sua Excelência o Presidente da República, João Lourenço, no seu discurso de investidura, referiu a necessidade do reforço dos valores morais, a garantia da coesão social e o fomento do patriotismo.

Cabe a vós enquadrar estas orientações no âmbito do papel que a família deve desempenhar no quadro da harmonia comunitária e social.

É isso que a sociedade espera de vós, enquanto membros deste fórum de reflexão e debate, para definição de políticas públicas no quadro da assistência social e da promoção da família, com base no Programa Nacional de Desenvolvimento 2018-2022 e da estratégia a longo prazo Angola 2025 que contem as orientações do Executivo no sentido de implementação de um conjunto de Políticas que garantam a melhoria do bem estar e da qualidade de vida das famílias Angolanas.

 É neste quadro que declaro aberta a 21ª Sessão do Conselho Nacional da Família, desejando um profícuo dia de debates e que possam chegar às conclusões pelas quais a sociedade anseia.

Muito obrigada.

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