DECLARAÇÕES DO PRESIDENTE LULA DA SILVA
DECLARAÇÕES DO PRESIDENTE LULA DA SILVA | Palácio do Planalto, Brasília, 23 Maio 2025
“ Eu quero cumprimentar a delegação angolana, a delegação brasileira, e quero dar as boas-vindas ao Presidente João Lourenço e à sua delegação.
Foi a Angola que fiz a minha primeira visita bilateral para a África em meu terceiro mandato. O Presidente Lourenço esteve em minha posse em 2023 e retornou no ano passado para a Cúpula do G20 a convite da Presidência Brasileira.
Esta visita de Estado é importante por vários motivos: celebra os 50 anos da Independência de Angola e os 50 anos do estabelecimento das nossas relações diplomáticas.
O Brasil se orgulha de ter sido o primeiro país a reconhecer a Independência angolana. Esta visita também é o ponto alto da Semana da África.
Desde segunda-feira, 44 delegações do continente africano e nove organizações internacionais estão no Brasil para o segundo diálogo Brasil-África sobre segurança alimentar, combate à fome e desenvolvimento rural.
Essa, na verdade, é a primeira actividade da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza que lançámos em Novembro do ano passado e hoje já conta com mais de 180 membros, dos quais 95 países.
O Presidente João Lourenço e eu mantivemos uma reunião de trabalho proveitosa em que discutimos temas bilaterais, regionais e multilaterais. Ampliar e diversificar a pauta comercial são prioridades. É importante lembrar que o Brasil já teve um fluxo comercial com Angola de quatro biliões e meio de dólares e agora estamos em apenas um bilião e meio de dólares. Significa, meus caros ministros brasileiros e ministros de Angola e ministras também, que nós temos que trabalhar mais para que a gente faça o nosso fluxo de comércio exterior ser do tamanho que a gente pensa que é os nossos países.
Eu tenho certeza de que voltaremos a superar em breve o nosso melhor momento no fluxo comercial. Por isso, é importante que a Petrobras volte a ter uma participação activa na prospecção, na pesquisa de combustível fóssil e também de petróleo e de gás.
Nós estamos modernizando os instrumentos de garantia de crédito às exportações. Angola – é importante lembrar isso – sempre foi um bom pagador e quitou a sua dívida com cinco anos de antecedência. Eu vou repetir aqui para a imprensa brasileira escrever em letras garrafais : Angola sempre foi um bom pagador e quitou sua dívida com cinco anos de antecedência! Por isso, ninguém tem que ter medo de vender alguma coisa para Angola ou fazer qualquer empréstimo para Angola, porque os angolanos são cumpridores dos seus deveres.
Assinaremos hoje importante acordo que viabilizará a retomada das linhas de financiamento e que incidirá em novas oportunidades para as economias. Também discutimos os avanços na cooperação técnica, em especial do Programa de Regiões Irrigadas e Agricultura Familiar do Vale Cunene, que lançámos em 2023.
A capacitação de técnicos angolanos vai transformar uma região historicamente árida em pólo produtor de alimentos, como fizemos no Vale de São Francisco. Aliás, Presidente João Lourenço, numa próxima visita sua ao Brasil, eu vou fazer questão de levá-lo na transposição das águas do Rio São Francisco, para você ver a obra majestosa de irrigação que foi feita naquela região, que envolvia 12 milhões de brasileiros que viviam passando fome e muita necessidade por conta da seca. Aí nós descobrimos que a seca era um fenómeno da Natureza, que a gente não ia conseguir fazer chover lá. Então, nós resolvemos levar uma água que transcorria no Rio São Francisco e depois ela ia para o mar.
Então, a gente resolveu que um pouco daquela água que ia para o mar, a gente fizesse um canal para levar água para essa região. Espero que um dia eu tenha a oportunidade de levá-lo para conhecer esse projecto de transposição das águas, que era um projecto que o Imperador Dom Pedro I, em 1846, tentou fazer e não conseguiu , porque a política não o deixou fazer. E quando eu assumi a presidência em 2003, eu assumi a responsabilidade de fazer esse canal. Enfrentámos todos os problemas que tínhamos que enfrentar e hoje o canal está 99% pronto. Ele nunca fica pronto, porque quando a gente termina uma parte, aparece uma outra região querendo que a gente faça uma extensão do canal e aí o canal vai andando de acordo com as necessidades do povo.
[ Na verdade, eu falei Dom Pedro I, não! Foi Dom Pedro II, foi Dom Pedro II, porque foi em 1846 que Dom Pedro I foi embora. Em 1831, é isso. Certo, eu não sei, eu não conheço História ].
Estamos aprofundando nossa cooperação na área da saúde com um programa de formação de recursos humanos que fortalecerá o Sistema Nacional de Saúde angolano. Aliás, DONI, encontramos um nome para o programa ontem.
É que nós estamos lançando um programa aqui; a Ministra da Saúde vai ter que saber. É um programa que nós estamos tentando há muito tempo e, finalmente, esse programa está pronto e a gente vai lançá-lo. Está sendo estruturado, que é levar o povo pobre a ter direito aos chamados especialistas, a ter direito a uma ressonância magnética, a ter direito a uma PET scan, porque normalmente os pobres morrem sem ter acesso aos especialistas e sem ter acesso à máquina. Pois, aqui no Brasil, a partir do lançamento do programa, o pobre vai ter direito a fazer os mesmos exames que o Presidente da República faz, quando ele vai fazer o check-up. Isso chama-se apenas respeito e conquista de direitos.
Em nossas universidades, oferecem-se mais de 500 vagas por ano a estudantes das mais variadas áreas médicas. Outra coisa, Presidente João Lourenço, que você precisa visitar quando vier ao Brasil outra vez, é a Unilab. A Unilab é uma universidade afrodescendente que foi aberta no meu governo para atender estudantes africanos e estudantes brasileiros.
Nós temos um campus na cidade de Redenção, no Estado do Ceará, que foi a primeira cidade a conquistar o fim da escravidão, no Ceará. E a outra é na Bahia, em São Francisco do Conde, que é outro campus, que eu tive o prazer de ir lá entregar o diploma para os primeiros meninos e meninas de África que se formaram aqui no Brasil.
A ideia era estender para todo o continente africano, mas o primeiro projecto piloto ficou só entre os países de língua portuguesa, o que não é mau, mas é pouco para um internacionalista como eu, que quer atender mais gente do que o Brasil precisa.
Também seguiremos cooperando na área da defesa e na modernização das frotas aérea e da marinha angolana. A Embraer está à disposição para a restauração da frota angolana de aeronave supertucano e fornecimento de aeronaves adicionais.
Na área da segurança, na questão de aviação, eu quero dizer aqui, para o Presidente, que nós vamos fazer questão junto a Embraer e junto ao BNDES para que ele possa financiar a venda dos três aviões K-190 que vocês querem comprar.
Na verdade, esse avião é só o substituto do Hércules e é um avião a jato. Ele é bom para o Brasil e é bom para Angola. Nós vamos fazer o esforço de ajudar Angola a comprar esses aviões.
Na área da segurança, a nossa Polícia Federal e a Polícia Nacional Angolana assinam hoje instrumentos de cooperação para combate ao crime organizado. Isso é muito importante. Eu dizia ao Presidente João Lourenço que nem os brasileiros sabem, mas um delegado brasileiro hoje é o secretário-geral da Interpol. A Interpol que vocês só viam em filmes. Agora, o Brasil tem o nosso secretário-geral da Interpol que é uma das instituições policiais mais respeitadas no Mundo. Portanto, quando precisar da Interpol, você sabe que você vai ter um brasileiro lá.
A recente inauguração do Consulado-Geral em Luanda possibilitará um melhor atendimento para os 30 mil brasileiros que formam nossa maior comunidade em África e, também, aos angolanos. Parabéns ao Ministério das Relações Exteriores da gente ter aberto um consulado em Luanda e ter tanto brasileiro lá. Isso demonstra que os brasileiros estão descobrindo os países africanos, porque no século XVII descobriram já. Voltaram e agora parece que estão retornando. Isso é um bom sinal.
Decidimos estender o prazo de validade dos vistos de visita para nacionais angolanos de dois para cinco anos. Outra coisa bastante importante. Como é natural entre parceiros estratégicos, discutimos assuntos de importância global.
Angola e Brasil compartilham um firme compromisso com o multilateralismo e a cooperação internacional. Em contexto que o mundo se defronta com tantos conflitos internos e internacionais, Angola é exemplo de país com actuação importante em processo de estabilização de África e na projecção do continente nos principais dilemas contemporâneos.
Cumprimentei o Presidente João Lourenço pelo título que recebeu da União Africana de Campeão pela Paz e Reconciliação, em reconhecimento ao seu papel como mediador da crise entre República Democrática do Congo e Ruanda. Por isso, meu companheiro João Lourenço, só falta você fazer uma coisa para me deixar extremamente feliz. Só falta isso: eu queria que você trouxesse algum jogador de Angola para jogar no meu Corinthia que não está muito bem das pernas.
O Brasil sediará em Novembro próximo a Cop30 em Belém, no coração da Amazônia. E sei que poderemos contar com o apoio de Angola e com a sua presença, Presidente. É muito importante essa Cop, porque essa Cop será um balizador se os países do mundo querem efectivamente enfrentar a questão climática ou não. Porque está cheio de presidentes que acham que não têm nada no clima, está tudo maravilhoso. E quem acha que tem, está preocupado. E eu acho que Angola jogou um papel importante.
África é a região do mundo que menos emite gás de efeito estufa, mas uma das que mais sofre as consequências perversas do aquecimento global. Não haverá transição justa sem que se considerem as circunstâncias dos países do sul global.
Até Setembro, todos os países deverão entregar as suas contribuições nacionalmente determinadas, as famosas NDC. Junto com a FAO, elaboramos um guião para a inclusão de políticas sociais e de transformação de sistemas alimentares nas NDC.
Os países ricos, que foram os maiores beneficiados pela economia baseada no carbono, precisam estar à altura de suas responsabilidades de financiamento da transição energética.
Expus ao Presidente João Lourenço que lançaremos na Cop o Fundo Florestas Tropicais para Sempre, que vai remunerar países em desenvolvimento que preservem as suas florestas. Com territórios que abrigam parte das duas maiores florestas tropicais do planeta, a Amazônia e o Congo, Brasil e Angola devem assegurar que a preservação desses biomas seja remunerada pelos serviços ecossistêmicos que prestam.
A nossa fronteira marítima, nesse querido rio chamado Atlântico, que compartilhamos, é rico em fauna e flora, das quais dependem, directa ou indirectamente, biliões de pessoas. Precisamos ampliar os compromissos com o uso sustentável da biodiversidade marítima. Essa é a mensagem que levarei à terceira Conferência dos Oceanos da ONU no mês que vem em França, na cidade de Nice.
O oceano também nos une na zona de paz e cooperação do Atlântico Sul, que ano que vem completará 40 anos. Seguiremos defendendo esses princípios na presidência brasileira dos BRICS este ano, também do qual V. Exª é convidado a participar do nosso BRICS aqui no Brasil.
A consolidação dos BRICS, como principal espaço de articulação dos países emergentes, é favorecida pela expressiva participação de países africanos como membros plenos, parceiros de diálogo e convidados.
Parabenizei o companheiro João Lourenço por sua eleição como Presidente de turno da União Africana e reiterei o convite para a cúpula dos BRICS, em Julho, no Rio de Janeiro.
Como grande admirador de Angola e entusiasta da relação do Brasil com os irmãos africanos, estou muito feliz com a presença do João Lourenço e da sua delegação no Brasil.
Espero que você tire proveito um pouco, conheça Brasília, conheça o Brasil e retorne sempre que possível.
Eu estava dizendo para os companheiros que estavam participando da reunião que, a partir de agora, todo o presidente com quem eu tiver uma reunião, eu vou pegar o telefone dele e vou dar o meu telefone.
Como eu não tenho telefone, eu dou o telefone dos meus assessores, eu dou o telefone da Janja. E esse é o melhor acordo que nós vamos assinar aqui, porque se a imprensa não sabe, é preciso saber. Às vezes, uma conversa de dois presidentes demora 15 dias para acontecer, porque você comunica ao Ministério das Relações Exteriores que você quer ter essa conversa, o Ministério das Relações Exteriores entra em contacto com o Ministério do outro país. O Ministério do outro país responde e aí vai ver se o Presidente daquele país pode. Quando ele pode, o presidente desse país não pode. E aí fica 15, 20, 30 dias enrolando uma conversa por telefone de três minutos, gente.
Então a partir de agora é o seguinte, sabe, qualquer presidente vai ter o meu telefone, como eu não tenho, vai ter o da Janja e vai ter o da minha assessoria. E eu quero ter o telefone de todo mundo, porque às vezes é uma coisa rápida, às vezes é uma coisa de 30 segundos: “João Lourenço, por favor, eu estou precisando de tal coisa”. E aí o João Lourenço me atende, não precisa nem de intérprete, que maravilha! Então, sabe, esse vai ser o maior acordo que eu vou fazer daqui para frente.
Bem, eu queria terminar dizendo para vocês que, diante da alegria de receber o João Lourenço aqui, a gente ficou sabendo uma notícia muito triste, porque eu até queria, em homenagem, pedir um minuto de silêncio para nós, pela morte do companheiro Sebastião Salgado. Certamente, se não o maior, um dos maiores e melhores fotógrafos que o mundo já produziu, que morreu hoje.
= MINUTO DE SILÊNCIO =
Muito bem. Aliás, também um comunicado aqui, que é o seguinte: não estava prevista a morte do companheiro Sebastião Salgado, e o meu chefe de cerimonial, do Itamaraty, tinha preparado, e nós vamos entregar como presente do Brasil ao João Lourenço, exatamente, uma pintura, uma fotografia do Sebastião Salgado.
Portanto, você vai receber a fotografia de um fotógrafo muito, mas muito, muito especial que o planeta Terra produziu.
Obrigado, gente! “