INTERVENÇÃO NA 1.ª REUNIÃO DO CONSELHO SUPERIOR DO CÍRCULO DE REFLEXÃO LUSÓFONA

-Sua Excelência Professor Doutor João Cravinho, Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, em representação de S. Ex.ª o Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros Professor Doutor Freitas do Amaral.

-Sua Excelência Senhor Secretário Executivo da CPLP;

-Suas Excelências Senhores Embaixadores membros do Comité de Concertação Permanente da CPLP e membros do Conselho Superior do Círculo de Reflexão Lusófona – Associação;

-Exmo. Senhor Professsor Doutor Ernâni Lopes, Presidente da Direcção do Círculo de Reflexão Lusófona – Associação

-Exmo. Senhor Dr. Adriano da Silva Januário Malalane, Presidente do Conselho Fiscal do Círculo de Reflexão Lusófona – Associação;

-Dignos associados do Círculo de Reflexão Lusófona – Associação;

-Senhores convidados;

-Minhas Senhoras e meus Senhores

Constitui para mim uma grande honra como Embaixador da República de Angola em Portugal, participar desta primeira reunião do Conselho Superior do “Círculo de Reflexão Lusófona – Associação”, na qualidade de Presidente do seu Corpo Consultivo, a fim de assumir um mandato rotativo de um ano. Tal como ditam os estatutos desta nossa nova organização, compete-nos, juntamente com os órgãos sociais, dinamizar actividades de ordem cultural, económica, social, empresarial e de solidariedade com vista ao desenvolvimento sustentado dos nossos países.

É minha interpretação pessoal que os estatutos do “Círculo de Reflexão Lusófona -Associação” ao reconhecerem, em primeira instância, a Cultura como meio de progresso e de bem-estar social, validaram o importante papel deste sector no desenvolvimento da vida comunitária, bem como da endogeneidade como estratégia da sua acção programática.

Equacionando os factores que, na actual conjuntura mundial, podem proporcionar um maior crescimento económico e um maior bem – estar para as populações dos países em desenvolvimento, à Cultura destaca-se como elemento fundamental da vida de cada indivíduo e de cada comunidade.

parafraseando essa figura imensa do pensamento africano que foi Cheik Anta Diop – “A cultura juntamente com a História constituem a componente essencial da identidade dos povos”.

Minhas senhoras e meus senhores

A maioria dos países africanos, bem como Timor-Leste, herdou a necessidade e a tarefa ingente de construir e consolidar a unidade nacional, forjando no interior de cada cidadão, o respeito e a aceitação das diferenças, que caracterizam as sociedades multiculturais e plurilingues dos nossos jovens Estados. Daí que, o papel da Cultura, na construção das identidades nacionais, constitui, em meu entender, uma questão incontornável de afirmação da nossa identidade e da nossa soberania. Mais do que um espaço destinado ao mero exercício académico, à recreação, ou à contemplação resultante dos estados de alma, a Cultura passou também a ser vista, nos dias de hoje, como um factor de desenvolvimento.

Já em 1982, a recomendação nº 27 da Conferência Mundial sobre Políticas Culturais, realizada no México, aconselhava-nos a “(…) ter em consideração a dimensão cultural nos processos de desenvolvimento e estimular as aptidões criadoras e a vida cultural no seu conjunto (…) no intuito de contribuir para a revelação dos grandes desafios mundiais, que se apresentam no horizonte do século XXI”.

Esta recomendação, fruto de um conjunto de reflexões críticas, que surgiram a partir da década de 70, apesar dos progressos ainda registados em alguns países, antevia já os limites de uma concepção de desenvolvimento fundada exclusivamente no crescimento quantitativo e material. Daí que, ponha em causa a eficiência e a eficácia das estratégias meramente economicistas, já que, as mesmas dificilmente conseguem dar resposta aos grandes desafios com que se debatem os países em desenvolvimento. São eles: a erradicação da fome e a extrema pobreza; a redução da mortalidade infantil; o combate ao HIV/SIDA, à malária e as outras endemias; o melhoramento da saúde materna; a obtenção generalizada do ensino primário universal; a promoção da igualdade entre sexos e a autonomização das mulheres; a garantia da sustentabilidade ambiental, a unidade na diversidade…para apenas citar os principais.

De acordo com o relatório de Desenvolvimento Mundial do Banco Mundial, de 2000/2001 – exceptuando os casos pontuais resultantes de situações de conflito armado, catástrofes naturais, endemias e outros tipos de insegurança social, (que não são poucos nos países em desenvolvimento) – desde 1960, a esperança de vida nos países pobres aumentou, em média, 20 anos: a taxa de mortalidade infantil, desde 1960, diminuiu mais de metade; o número de matrículas escolares entre 1990 e 1998, cresceu 13%; o número de pessoas em situação de extrema pobreza baixou para 78 milhões.

Todavia, é também um facto que, dos 6 mil milhões de habitantes hoje existentes no planeta, quase metade vive com menos de dois dólares por dia e um quinto desta população com menos de um dólar. Consequentemente, agravaram-se, profundamente, os casos de fome em todo o Mundo, ao ponto de a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (– FAO-) ter solicitado a formação urgente de uma grande aliança internacional para a sua erradicação.

Na actual globalização da economia, a criação de uma parceria mundial para o desenvolvimento é um imperativo imprescindível para os países pobres, independentemente, do seu potencial em matérias-primas. A nossa experiência, incluindo aquela que nos foi viabilizada por ensaio e erro, mostra-nos que, sem a adequada qualificação dos nossos recursos humanos; não se tornará possível alcançar uma maior autonomização. Os cidadãos, enquanto criadores de inovação e de riqueza, se não forem educados para a actividade laboral; se não forem educados para a afirmação da sua identidade cultural e para o reconhecimento e respeito pelas demais; se não forem educados para a cidadania; não conseguirão fazer emergir os países pobres, mesmo os potencialmente ricos, do patamar de subdesenvolvimento em que se encontram mergulhados. A cooperação bilateral e multilateral entre Estados é uma das formas de enfrentar a agressividade da globalização.

Ao nível dos países de língua oficial portuguesa, a CPLP vem sendo o espaço institucionalmente privilegiado para a cooperação multilateral e pluridisciplinar entre os nossos Estados. O Círculo de Reflexão Lusófona será, por vocação um espaço privilegiado da sociedade civil, para o reforço dos laços de solidariedade e cooperação nos países membros da CPLP. Sempre foi nosso entendimento que as necessidades de cooperação, nunca se deveriam esgotar ao nível estatal. Desde sempre reconhecemos o importante papel, que cada sociedade civil poderá desempenhar, em complementaridade com os Estados, nos diferentes processos de desenvolvimento.

Contudo, para que as acções de cooperação, como instrumentos de mudança e impulsionadores do progresso redundem em fracasso, há um conjunto de princípios que não podemos descurar:

- O princípio da reciprocidade, que envolve o reconhecimento de vantagens mútuas em qualquer processo de cooperação;

- O princípio da adequação, para que as acções de cooperação sejam realizadas de acordo com as necessidades e os recursos existentes;

-O critério da economia, para que em igualdade de circunstâncias, se utilizem sempre as estratégias menos dispendiosas;

- O critério da economia, para que em igualdade de circunstâncias, se utilizem sempre as estratégias menos dispendiosas;

- O critério da interactividade, que procura estabelecer um patamar mínimo de interacção entre o sistema cooperante e o sistema – cliente;

- O critério da alternativa, que aconselha a recorrer aos meios possíveis, na impossibilidade de se alcançarem os meios mais desejados.

Enfim, só com uma preparação cuidada do planeamento, identificando metas e congregando esforços para a realização de acções comuns, se torna possível obter uma cooperação eficaz; ou seja, uma cooperação onde os resultados previstos correspondam aos resultados alcançados, sem cair no chamado “sindroma de paralisia por análise”, caracterizado pelo excesso de perfeccionismo tecnicista, onde se desperdiça a maior parte dos recursos e se perde de vista o verdadeiro objectivo. A concertação de ideias e de vontades é determinante para a eficácia da cooperação.

Não basta que os objectivos sejam bem definidos por quem deve fazê-lo. Segundo Amartya Sem, ex membro da presidência do Banco Mundial, galardoado com o Prémio Nobel de Economia, em 1998, há sempre a necessidade de se estabelecer “(…) papéis de sustentação de entrega sob a encomenda”. A negociação é fundamental e deverá ser feita numa base de reciprocidade, para que se possa ultrapassar a fase de intenção da acção. Daí que, os princípios que sustentam a cooperação impliquem, obrigatoriamente, na formação de pessoas que, de uma maneira ou de outra, irão influenciar, de forma decisiva, o processo de reabilitação em diferentes comunidades.

A eficiência põe a descoberto duas questões que estão intrinsecamente ligadas: a identificação dos recursos e a sua hierarquização. Nesta conformidade, só optimizando os resultados em relação aos recursos disponíveis, se torna possível alcançar a eficiência em qualquer processo de intervenção direccionado para um desenvolvimento comunitário. A identificação dos recursos, como acto eminentemente humano, implica competência técnica, uma vez que está em causa a apropriação de conhecimentos em diferentes áreas do saber; implica criatividade, a partir do conhecimento e da interpretação correcta da realidade; e implica a necessidade de haver inteligência emocional, porque as atitudes positivas são meios essenciais para a superação de muitos dos problemas com que se debatem os países em desenvolvimento.

A hierarquização dos recursos requer contenção de gastos, uma vez que estes são sempre escassos, particularmente, em países saídos de situações de conflito.

Excelências, minhas senhoras e meus senhores.

Tenho bem presente uma afirmação muito feliz de um dos promotores da ideia da criação do círculo – O Professor Ernâni Lopes – hoje Presidente da sua direcção, que me permito citar: “O círculo não será um executor mas um propiciador de acções”. E propiciarei na fase dos princípios de equidade, transparência e vantagens mútuas.

Vivemos um momento novo e, a partir de hoje, aguarda-se uma maior visibilidade para as acções de cooperação que pretendemos ajudar a desencadear, no espírito das nossas relações e horizontalidade, que nos impõe princípios de reciprocidade, de igualdade e de respeito mútuo.

Minhas Senhoras e meus Senhores.

Como é do conhecimento geral, o conceito de Lusofonia, tal como vulgarmente vem sendo apresentado, nem sempre é interpretado e aceite do mesmo modo por todos os Estados membros da nossa Comunidade de Países de Língua Portuguesa. No momento em que procuramos imprimir um maior dinamismo à nossa cooperação, julgo oportuno que, o círculo de Reflexão Lusófona Associação, promova um encontro de académicos dos nossos países e ponha este conceito à apreciação dos mesmos. Julgo que é o momento oportuno para, nos dias de hoje reflectirmos mais profundamente o conceito de Lusofonia com serenidade e sem problemismos escusados. Em causa, está a necessidade de tornarmos esse conceito equitativamente mais abrangente e mais realista, quer de acordo com o momento político que vivemos, quer de acordo com as diferentes realidades sócio-culturais dos países africanos de Língua Oficial Portuguesa.

Como afirmei anteriormente, a concertação de ideias e de vontades é determinante para o sucesso. O sucesso deste projecto é preocupação de todos nós.

Antes de terminar, permitam-me ainda que expresse o meu mais profundo pesar, pelo desaparecimento físico de um dos membros desta associação, Dr. Albérico Cardoso, que em vida foi Vice-Presidente da Direcção do Círculo de Reflexão Lusófona-Associação. Albérico Cardoso, foi sempre um devoto impulsionador da cooperação no seio dos nossos países e, estou certo que, se ainda estivesse em vida, dedicaria o melhor do seu esforço e da sua vontade em prol desta organização. Porém, estou certo, que todos juntos, numa mesma direcção, temos a necessidade e a obrigação de atingir os objectivos preconizados pelo círculo.

À medida que o nosso sentido de alteridade se for aperfeiçoando, o cumprimento dos nossos propósitos irá sendo alcançado. À medida que nos formos conhecendo melhor, na comunidade de afectos e de vontades a que pertencemos, cresceremos em resultados e, consequentemente, em credibilidade.

Formulo a todos os melhores votos de um trabalho empenhado, gratificante e profícuo em prol dos objectivos desta Associação.

Muito Obrigado.

Lisboa, 20 de Abril de 2005

Residência Oficial de Angola em Portugal

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