Colecção de pintura sobre vida e obra de António Agostinho Neto em mostra

Uma colecção de pinturas do artista plástico António Domingues, que faz parte de uma edição especial de ilustrações trilingue (português, inglês – francês), do livro “Sagrada Esperança”, é inaugurada hoje às 18h00, e fica patente até 10 de Novembro do ano em curso, na Galeria de Exposições do Memorial Dr. António Agostinho Neto, na Praia do Bispo, em Luanda, como entrada livre.

A colecção é composta por dez quadros, onde o artista utilizou a técnica do óleo sobre tela com cores quentes e foi exposta pela primeira vez quando o corpo do Fundador da Nação foi transladado para o Mausoléu onde jaz. A exposição especial, para saudar o centenário do Poeta Maior, fica patente ao público até 10 de Novembro do ano em curso, com acesso livre

De acordo com o docente, pesquisador e antigo director do Instituto Nacional do Património Cultural (INPC), Óscar Guimarães, um dos promotores da iniciativa, explicou, ontem, ao Jornal de Angola, que os desenhos remontam da década de 1989, numa edição da União dos Escritores Angolanos (UEA).

A colecção, disse, foi adquirida pelo Estado angolano para fazer parte da decoração do Mausoléu, muito antes da construção do actual Memorial Dr. António Agostinho Neto.

Na altura, no Mausoléu, revelou, as obras estavam sob controlo da então Secretaria de Estado da Cultura, e só depois, passou a guarda do Instituto Nacional do Património Cultural (INPC). Óscar Guimarães lamentou o facto da maior parte da população angolana desconhecer a existência da colecção que ilustra a edição especial do “Sagrada Esperança”, que foi exposta muito poucas vezes.

Lembrou que a colecção de pinturas surrealistas foi exposta pela primeira vez , quando o corpo do Primeiro Presidente de Angola foi depositado, pela primeira vez, no Mausoléu, na década de 1991, depois retirada, devido à continuação das obras de construção do agora Memorial.

Como não poderia ficar de forma permanente e exposta devido às obras, comentou,  teve de ser retirada e levada para o depósito do INPC, onde permaneceu durante vários anos. A mes-ma colecção de desenhos já foi exposta na Huíla e Benguela, segundo os seus registos memoriais.

Agora recuperada, sublinhou, cada pintura dos dez quadros que ilustram a obra “Sagrada Esperança”, representam igual número de poemas de Agostinho Neto, cuja importância estética e cultural  tem valor universal, assente no realismo e na necessidade de libertação, assim como de voltar às origens e às tradições.

Em conversas, disse, houve a ideia de se fazer uma exposição permanente dos desenhos, com a duração de cinco anos, cumprindo um acordo de cooperação cultural entre INPC, Memorial Dr. António Agostinho Neto e o apoio do Goethe Institut Angola.

Os visitantes, garantiu, vão poder apreciar o valor estético e surrealista das obras de António Domingues, que procuram dar outra dimensão e valorização ao livro “Sagrada Esperança”. “É uma oportunidade dos pesquisadores e estudantes poderem aumentar e ampliar os conhecimentos sobre a vida e obra de Neto”.

O brilhante percurso do artista plástico

António Domingues viveu e trabalhou em Angola, entre (1977 a 1983), tendo criado a colecção actualmente exposta para ilustrar a edição trilingue (português, inglês – francês) da obra “Sagrada Esperança” que hoje dá corpo a esta exposição.

Destacado artista plástico com grande intervenção na oposição ao regime fascista. Em 1947 esteve ligado à fundação do Grupo Surrealista de Lisboa. De 1977 a 1983, desenvolveu uma intensa actividade artística em Angola. Participou em dezenas de exposições individuais e colectivas em Portugal e no estrangeiro, destacando-se as Exposições Gerais de Artes Plásticas da SNBA. Homem solidário, de grande carácter e enorme talento. Era membro do Partido Comunista Português (PCP).

António Pimentel Domingues nasceu a 1 de Novembro de 1921, em Lisboa, e era filho do artista plástico santomense Mário Domingues. Estudou na Escola de Artes Decorativas António Arroio, escola em que mais tarde leccionou. Enquanto estudava à noite, António Domingues foi ferrageiro e maquetista numa litografia, onde se especializou em artes gráficas. Em 1942, frequentou as tertúlias artísticas do café Hermínius, na Avenida Almirante Reis, em Lisboa.

Ligado de início ao neo-realismo, viria a ser um dos membros fundadores do Grupo Surrealista de Lisboa, em 1947, em conjunto com companheiros de sempre (Leonel Rodrigues, Moniz Pereira, Marcelino Vespeira, Alexandre O’Neill, Mário Cesariny e outros), influenciados pelo movimento francês, que se estendeu por diferentes artes, da pintura à literatura.

Em 1949 afasta-se, ainda antes da primeira e única exposição do grupo, na qual participa apenas através de uma obra colectiva, “Cadavre Exquis”, de parceria com Fernando Azevedo, António Pedro, Vespeira e Moniz Pereira (Colecção do CAM, Fundação Ca-louste Gulbenkian, Lisboa).

Apesar da sua participação nesse movimento ter sido breve, deixou também alguns poemas. Depois, irá experimentar a abstracção para regressar, em 1953, ao neo-realismo.

Passagem por Angola

Viveu alguns anos em Angola, onde ilustrou várias obras de autores angolanos, nomeadamente “A Sagrada Esperança”, de Agostinho Neto, e os livros de literatura infantil de Eugénia Neto. Deu aulas e realizou trabalhos como gráfico e ilustrador, e por fim regressou à pintura. Expôs individualmente e participou em inúmeras mostras colectivas, nomeadamente nas Exposições Gerais de Artes Plásticas (SNBA, Lisboa), entre 1946 e 1956. Teve actividade como ilustrador.

Entre as exposições individuais que realizou, destacamos: 1977, Exposição Retrospectiva, Museu Nacional da Natureza, Luanda, Angola; 1986, União dos Escritores Angolanos (UEA), em 1988, SNBA, Lisboa, em 1994, Biblioteca Municipal Camões, Lisboa, em 1996.

Era membro do Partido Comunista Português (PCP) desde 1946 e, depois do 25 de Abril, pertenceu à Célula das Artes Plásticas do Sector Intelectual de Lisboa. Empenhado colaborador em iniciativas do PCP, com destaque para a Festa do Avante! e a sua Bienal de Artes Plásticas. Faleceu no dia 14 de Agosto de 2004, aos 84 anos. Deixou uma autobiografia, publicada, em 1986, pelo jornal “Diário”.

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