Paz na RCA é viável

Fotografia: Rogério Tuti
Os presidentes de Angola e do Chade defenderam, ontem, em Luanda, a paz e a segurança em África como factores fundamentais para progresso do continente e o bem-estar dos africanos.
José Eduardo dos Santos e Idriss Déby Itno, que presidem, respectivamente, a Conferência Internacional para os Grandes Lagos (CIRGL) e a Comunidade de Económica dos Estados da África Central (CEEAC), apontaram a situação da RCA como uma preocupação premente da agenda política africana.
Ao discursarem durante o almoço oficial oferecido pelo Chefe de Estado angolano ao seu homólogo chadiano, no Salão Nobre do Palácio da Cidade Alta, os dois líderes africanos reafirmaram o desejo de haver um maior envolvimento da Comunidade Internacional para uma solução duradoura para o conflito na República Centro Africana.
O Presidente angolano referiu ao conflito na RCA, que pela dimensão e implicações, representa uma ameaça à paz e segurança da região e compromete os esforços de desenvolvimento dos demais países do espaço CEEAC. “A paz e a segurança são dois pilares sem os quais não é possível alavancar o desenvolvimento, o progresso social e o bem-estar dos nossos povos”, defendeu José Eduardo dos Santos.
O Chefe de Estado angolano considerou as demonstrações de solidariedade por parte da comunidade internacional, como uma porta que se abre para que o fim do conflito entre os centro-africanos. “As iniciativas empreendidas pela comunidade internacional, ao mobilizarem as forças das Nações Unidas e da MISCA para se juntarem às forças de estabilização da CEEAC, merecem o apoio de todos os países porque representam uma oportunidade para se restabelecer a normalidade constitucional no país”, assinalou.
José Eduardo dos Santos manifestou a sua preocupação face a ocorrência de confrontos entre a população civil e as forças de manutenção de paz, de que resultaram vítimas mortais. O Chefe de Estado angolano defendeu a tomada de medidas enérgicas e pertinentes para que casos como estes não voltem a repetir-se. “Essas situações devem ser prevenidas ou reparadas de modo exemplar e inequívoco”, defendeu.
Para o líder chadiano, os focos de tensão e os conflitos como o da RCA são uma séria ameaça à paz e segurança internacional, bem como a unidade e a coesão dos países em desenvolvimento, onde se inclui África e em particular o espaço CEEAC. “A realização dos nossos objectivos comuns só pode ser alcançado se a paz e tranquilidade prevalecer em todo o nosso continente e particularmente na nossa região”, declarou o Presidente Idriss Déby Itno.
O líder chadiano saudou, entretanto, a decisão da ONU de até Setembro, aumentar para cerca de doze mil soldados a força de paz na RCA, a fim de garantir a segurança dos próprios centro-africanos.
Construir amizade
O Presidente Idriss Déby Itno manifestou o desejo de construir uma cooperação com Angola “forte, dinâmica e frutífera”, alicerçada uma relação de amizade e de irmandade entre angolanos e chadianos. “Quero reafirmar a vontade do povo chadiano para viver em paz e harmonia com o povo irmão de Angola e o desejo de construir, sobre uma base sólida, saudável e sustentável, uma cooperação multifacetada para o bem maior dos nossos respectivos povos”, declarou.
Primeiros acordos
A visita oficial do Presidente Idriss Déby Itno a Angola ficou também marcada pela assinatura de três instrumentos jurídicos, os primeiros na história da cooperação bilateral, apesar da longevidade das relações diplomáticas.
Ontem, o ministro das Relações Exteriores, Georges Chikoti, e o ministro dos Negócios Estrangeiros do Chade, Mousshfaki Mahamat, assinaram o Acordo Geral de Cooperação, o Acordo que cria a Comissão Bilateral de Cooperação e o Memorando de Entendimento sobre Consultas Políticas Regulares.
O Chade já manifestou interesse em cooperar com Angola no domínio dos petróleos, energia, transportes, aviação civil, entre outros, e é com base nos acordos assinados ontem que os dois países vão poder assinar outros acordos sectoriais e materializar o desejo de estabelecer uma parceria reciprocamente vantajosa, como referiu o director para África do Ministério das Relações Exteriores.
O Jornal de Angola apurou que para acelerar a cooperação em vários domínios, Ndjamena pretende abrir uma representação diplomática em Luanda.
Diálogo e compreensão
O Presidente do Chade discursou no Parlamento angolano, que ontem realizou uma sessão extraordinária. Idriss Déby Itno defendeu a cooperação e a solidariedade entre os povos e a interdependência entre os países africanos para ultrapassar os problemas existentes.
“Os Estados africanos vão ganhar sempre com as relações concertadas no diálogo e na compreensão. Angola e o Chade têm há alguns anos relações multiformes, embora elas nunca tenham sido materializadas por um acordo de cooperação.” O Presidente do Chade reconheceu que África está em mutação social e económica e deve enfrentar vários desafios, devido à globalização e da crise económica internacional.
Idriss Déby Itno considerou que os governos africanos estão na primeira linha, mas defendeu que os parlamentos devem acompanhar e apoiar essa luta, para o bem-estar das populações e da dignidade do homem africano.
O Chefe de Estado chadiano afirmou que os parlamentos são importantes na consolidação da democracia e desempenham um papel decisivo no desenvolvimento económico-social e cultural dos países.
Idriss Déby Itno, que falava durante uma sessão solene na Assembleia Nacional, enquadrada na sua visita de dois dias a Angola, considerou o Parlamento o símbolo de uma Angola livre e democrática, voltada para o desenvolvimento económico e cultural e no interesse do povo. “Esta Assembleia Nacional apresenta também o rosto de um país que soube livrar-se das guerras coloniais e de conflitos internos para poder progredir para a paz, modernidade e prosperidade”, disse.
Busca da paz
O presidente da Assembleia Nacional afirmou que Angola reconhece o valor da paz, por isso apoia os esforços do Chade. Fernando da Piedade Dias dos Santos acrescentou que o Parlamento angolano posicionou-se como um actor activo no processo político da paz e da reconciliação nacional. “Empenhado em preservar este bem, a Assembleia Nacional aprovou a Constituição e reformou o quadro legal estruturante do sistema político angolano”, disse.
Fernando da Piedade Dias dos Santos considerou que a aposta na economia, principalmente na diversificação da estrutura produtiva, na manutenção das taxas de crescimento e redução sustentável da inflação, têm dado resultados satisfatórios.
O presidente do Parlamento angolano destacou o crescimento económico que o Chade regista, tendo referido que este progresso se deve ao estabelecimento da paz, como condição indispensável do processo político e de consolidação da democracia. “As reformas políticas em curso no Chade permitiram que este país da África Central tivesse uma Constituição democrática assente no reconhecimento da diferença, a primazia da unidade nacional, indivisibilidade territorial e a coesão social.”
O líder do Parlamento angolano destacou ainda o papel do Chade nas relações internacionais africanas, em particular na sua participação activa em operações de manutenção de paz na RCA, onde a ameaça de um genocídio continua a preocupar a comunidade internacional. Para Fernando da Piedade Dias dos Santos este facto renova a certeza de que as zonas de integração regionais são promotoras da paz e do desenvolvimento de uma economia de complementaridade e proximidade.
Homenagem a Neto
Ontem o Presidente do Chade visitou o Memorial Doutor António Agostinho Neto, localizado na nova Marginal de Luanda, onde depositou uma coroa de flores, em homenagem ao primeiro Presidente de Angola.
Idriss Déby Itno depositou uma coroa de flores no busto do fundador da Nação angolana, assinou o livro de honra e passou pela galeria, construída em homenagem ao Poeta Maior, e onde se encontra o “Içar da Bandeira”, poema dedicado aos heróis angolanos.
No final da visita, o Presidente chadiano lamentou o facto de só agora ter tido a oportunidade de visitar Angola e disse ter ficado impressionado com o progresso do país. “Estou triste pelo facto de estar em Angola pela primeira vez. Estou impressionado com o que vejo. Mesmo estando nos nossos países, acompanhamos a História de Angola”, referiu o estadista chadiano.
Sobre o Fundador da Nação angolana, Idriss Déby Itno lembrou que começou a ouvir falar de Agostinho Neto muito cedo. “Ainda estávamos na escola, quando ouvíamos falar de Agostinho Neto, um homem não só de Angola, mas de África. Por isso, deixou um legado tão importante ao continente, cujos feitos permanecem”, enfatizou.
Mais adiante, Idriss Déby Itno lamentou a morte prematura do primeiro Presidente angolano. “Estamos tristes, pois embora tenha feito muito, a morte levou-o prematuramente. Mas os seus ensinamentos e aquilo que deu ao povo angolano e africano para o alcance da paz, da liberdade e do desenvolvimento continuam presentes. Vemos tudo isso nas suas obras.”
O Presidente chadiano disse que os africanos devem seguir exemplos como os de Agostinho Neto, principalmente os que têm a ver com o desenvolvimento, a estabilidade e a liberdade.