Discurso do PR no congresso das jurisdições constitucionais de África

Íntegra do discurso pronunciado nesta segunda-feira, em Luanda, pelo Presidente da República, João Lourenço, na sessão de abertura do V Congresso da Conferência das Jurisdições Constitucionais de África.

Luanda, 10 de Junho de 2019.

 EXCELENTÍSSIMA SENHORA PRESIDENTE EM EXERCÍCIO DA ASSEMBLEIA NACIONAL,

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL,

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL SUPREMO,

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA,

EXCELENTÍSSIMO SENHOR REPRESENTANTE DA COMISSÁRIA E REPRESENTANTE DA UNIÃO AFRICANA,

EXCELENTÍSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA CONFERÊNCIA DAS JURISDIÇÕES CONSTITUCIONAIS DE ÁFRICA,

EXCELENTÍSSIMO SENHOR SECRETÁRIO-GERAL DA CONFERÊNCIA MUNDIAL DE JUSTIÇA CONSTITUCIONAL,

EXCELENTÍSSIMOS SENHORES JUÍZES PRESIDENTES DAS JURISDIÇÕES CONSTITUCIONAIS,

EXCELENTÍSSIMOS SENHORES MEMBROS DO GOVERNO CENTRAL E DA PROVÍNCIA DE LUANDA,

EXCELENTÍSSIMOS SENHORES MEMBROS DO CORPO DIPLOMÁTICO ACREDITADO EM ANGOLA,

MINHAS SENHORAS E MEUS SENHORES,

Tenho o grato prazer de saudar todas as individualidades presentes e, em meu nome e em nome do povo angolano, apresentar as calorosas boas-vindas a todos os delegados e participantes vindos do exterior, a quem formulo votos de uma agradável estadia no nosso país.

A República de Angola tem hoje o privilégio de acolher o V Congresso da Conferência das Jurisdições Constitucionais de África, um fórum de justiça constitucional instituído em Kampala, em Julho de 2010, e tornado efectivo no ano seguinte em Argel, para abrir portas ao progresso de África no que diz respeito ao Estado de Direito, à democracia e aos direitos fundamentais da pessoa humana.

Felicito a Comissão da União Africana, presente neste e em todos os anteriores congressos, o que demonstra a sua firme determinação de apoiar os ideais dos pioneiros da organização, e também todos os países que mantiveram até aqui acesa a chama da Conferência das Jurisdições Constitucionais de África.

A República de Angola, que conquistou a paz em 2002 depois de décadas de guerra, felizmente ultrapassada, aprovou em 2010 a sua actual Constituição, que reitera a construção de um Estado de Direito fundado no pluralismo político, no convívio democrático e na liberdade económica.

Por essa razão, a realização deste congresso na nossa capital, com a presença de juízes de vários países do nosso continente e de convidados extra-africanos, representa para nós um reconhecimento dos progressos realizados internamente no plano político e constitucional, fruto do empenho do nosso povo, dos seus representantes eleitos no Parlamento e dos juízes dos vários tribunais superiores.

Reconhecemos, no entanto, que temos ainda um longo caminho a percorrer. Em curso está uma profunda reforma do judiciário, quer com a criação dos tribunais de Comarca, quer com a aprovação de novos ordenamentos jurídicos, como é o caso do novo Código Penal e de Processo Penal.

Está a ser levado a cabo um combate não só contra a corrupção e contra todas as práticas lesivas do interesse público, mas também contra a especulação e a exploração dos mais vulneráveis, com vista a uma mais justa e equitativa distribuição dos recursos do país.

Em curso estão igualmente os preparativos para as primeiras Eleições Autárquicas, que vão permitir uma mais directa participação dos cidadãos na solução dos problemas locais e um melhor desenvolvimento harmonioso do país a partir dos municípios.

MINHAS SENHORAS E MEUS SENHORES,

O tema geral desta conferência – ‘A implementação do Estado de Direito e a independência do Sistema Judicial: da teoria à prática actual’ – constitui um apelo dirigido a todos os operadores judiciários, para que assumam a tutela dos direitos fundamentais.

Num Estado de Direito, como é consabido, cabe aos juízes realizar a Justiça, vista como um bem social que carece da protecção do Estado. É por isso que se reconhece aos juízes independência dentro da legalidade e se atribui a maior importância à justiça constitucional.

Os Tribunais Constitucionais inscrevem-se, assim, num projecto político e económico global, o que pressupõe uma justiça eficiente, imparcial, livre de qualquer traço de corrupção, favoritismo ou nepotismo, males que ainda assolam, infelizmente, muitos países do nosso continente.

Os temas em discussão nesta conferência vão permitir percorrer as diversas Jurisdições Constitucionais africanas, partilhar experiências e explorar os avanços e conquistas alcançadas por cada uma delas, abrindo novos caminhos para a consolidação do Estado de Direito, numa África que se pretende cada vez mais inclusiva, com o acesso à educação, à saúde e à habitação e ao direito à segurança, à livre circulação, ao emprego e à liberdade de expressão e confissão religiosa, entre outros.

Em Angola, o papel do Tribunal Constitucional é muito claro, sendo a mais alta jurisdição em matéria constitucional. Julga a constitucionalidade das leis e garante os direitos fundamentais da pessoa humana e as liberdades públicas. É o órgão regulador do funcionamento das instituições e das actividades dos poderes do Estado, constituindo, deste modo, a salvaguarda do edifício da democracia.

MINHAS SENHORAS E MEUS SENHORES,

A estabilidade política na maioria dos países tem na Constituição a sua chave de ouro. A independência e imparcialidade dos juízes são, por isso, fundamentais para essa estabilidade.

De um modo geral, as Assembleias Constituintes fazem dos Tribunais Constitucionais os guardiões da constitucionalidade, conferindo-lhes poderes e meios que não existem em outros ramos do Direito, como por exemplo o poder de declarar a nulidade de normas ou actos que violem a Constituição, o que também acontece quando os Tribunais Constitucionais têm competências eleitorais.

O valor e o respeito das instituições, o respeito pela legalidade e a independência da magistratura estão presentemente ligados um pouco por toda a parte à ideia da democracia e da liberdade. Daí a sua força e importância na ordem jurídica.

Reconhecemos os progressos de África no estabelecimento das Jurisdições Constitucionais, embora só a partir dos anos 50, com o grande surto das independências políticas, se foi tornando crescente a criação dessas jurisdições.

Há apenas alguns anos, a justiça constitucional estava confiada aos Tribunais Supremos, que adoptavam uma Sala ou Câmara Constitucional. Em outros casos, a Jurisdição Constitucional era formalmente criada, mas sem funcionalidade, apesar da sua autonomia orgânica.

Actualmente, no nosso continente, o juiz constitucional é o garante da constitucionalidade e da ordem jurídica. As Jurisdições Constitucionais asseguram a constitucionalidade das leis e dispõem de competências variadas. Algumas limitam-se ao controlo da constitucionalidade, mas na sua maioria estão dotadas de funções de regulação do funcionamento dos poderes públicos e de garantia dos direitos fundamentais, conhecem recursos extraordinários, fiscalizam preventivamente as normas e resolvem os diferendos eleitorais, entre outras faculdades.

Contudo, este êxito não nos deve impedir de fortalecer o judiciário constitucional, visto como uma prioridade no fortalecimento da democracia no nosso continente, sendo importante assegurar instrumentos jurídicos que confiram a independência do judiciário, com vista à solução dos inúmeros problemas.

MINHAS SENHORAS E MEUS SENHORES,

Os modelos keynesianos de justiça constitucional, por um lado, e o de unidade jurisdicional de inspiração norte-americana, por outro, que influenciam as diversas jurisdições de África, não nos devem dividir por serem diferentes. São modelos clássicos fundados sobre o modo de organização da jurisdição e têm ambos por missão assegurar o Estado de Direito, a democracia e os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos.

A Conferência das Jurisdições Constitucionais de África facilita a troca de ideias e experiências entre os seus membros, na óptica da promoção e defesa das ideias democráticas, do reforço da autoridade de cada instituição-membro e da garantia do respeito da dignidade da pessoa humana. É desenvolvendo as relações entre os Tribunais Constitucionais dos vários países que se contribui para o aprofundamento e consolidação do Estado de Direito no nosso continente.

Hoje, o papel dos Tribunais Constitucionais já não se restringe à interpretação do Direito Constitucional nacional, isoladamente. Os Tribunais Constitucionais cooperam entre si numa base bilateral e a um nível multilateral e, cada vez mais, definem a sua visão sobre a jurisprudência de outros Tribunais Constitucionais, a fim de encontrar soluções para problemas domésticos que já foram resolvidos em outras paragens.

Em tempos de globalização da justiça constitucional, o diálogo deve ser permanente. O intercâmbio de ideias e experiências sobre questões submetidas aos Tribunais Constitucionais ou que interessem à sua organização e funcionamento é favorecido pelos temas que este Congresso se propõe discutir. Espero, pois, que os seus trabalhos tenham êxito e alcancem os objectivos preconizados.

Declaro aberto o V Congresso da Conferência das Jurisdições Constitucionais de África!

Muito Obrigado!

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